terça-feira, 7 de maio de 2013

Na vida acontece inevitavelmente darmos as coisas por adquiridas. Não sei que raio de gene humano é este, que nos rega a mente de constante insatisfação, uma porra de um queixume, porque ganhamos menos, não gostamos do que fazemos, queríamos sair mais cedo, queríamos férias no Brasil, queríamos, queríamos queríamos…


Mas temos saúde, temos filhos, temos amor. Temos família, temos cervejas ao final do dia, temos tanta coisa que não damos valor, e às vezes, a vida resolve rebentar-nos com um sismo em cima, abalando-nos as certezas, derrubando paredes mestras que, por terem sempre lá estado, passámos por elas sem as olhar.

Estes últimos dias passei por um desses. Sou uma pessoa privilegiada, mais que privilegiada, sou infinitamente abençoada, porque tenho comigo os meus avós. Mais que avós, são eles referências brutais na minha vida, são as companhias de fim de semana, os passeios na praia em miúda, são gelados, brinquedos e baloiços, ave-marias de olhos fechados, beijinhos tão diferentes de todos porque são eles treinados com uma geração de avanço. Juntos há quase 70 anos, os meus avós são os dois, cada um à sua maneira, uma aorta gorda no meu coração.

E de repente tenho o meu avô aviador, o avô dos barcos à vela e ski com 80 anos, o avô do golf e sestas, Marinha e Força Aérea, o avô, o meu avô, no hospital. Entrada com falta de ar sem previsão de saída. Pior a cada dia, médicos que falam sem nos olhar nos olhos, uma réstia de vida quando o beijei de garganta apertada a testa enrugada. A morte assusta-nos caramba, mas o sofrimento de quem amamos é avassalador. Foram dias que a alma andou num pêndulo de ânsia egoísta do quero-te aqui para mim sempre, ao leva-o rápido, acaba com isto depressa. E a minha avó, pequenina e assustada, mas sempre um furacão de força, sempre ali, incansável de lágrima nos olhos, mão na mão, palavras trocadas entre os dois numa cumplicidade que depois de 70 anos juntos ninguém consegue superar.

Pois bem, graças a Deus, foi um susto, que este cabrão deste destino faz-nos destas, e o avô acorda de um sono estranho, faz gracinhas, ralha, e ri-se para a minha avó, que já perdeu o olhar assustado e lhe dá caldos de mão fechada, novamente segura de si, novamente dona do seu destino.

Obrigada… Obrigada, infinitamente obrigada…

2 comentários:

  1. que bom! e que bom: voltaste!! já tinha saudades!

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  2. E faço minhas as suas palavras... Obrigada avô M. por tanto que é e tem sido na minha Vida ;)

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