segunda-feira, 29 de julho de 2013

Dois Velhos, um livro...

Lá fora chove, o vento uiva no pinheiro, que, contra todas as expectativas ainda vive. A lareira crepita, já não tem recuperador, optaram mais tarde pelo antigo mesmo, que deixa cheiro a raposino e cinzas no ar. Toca Mozzart no Ipod, de seguida Jack Johnson que há décadas que não lança nada de novo. Está escuro, a luz é só do fogo, os telefones estão desligados até porque, sabem os miúdos que neste dia não vale de nada ligarem porque não lhes atendem. Este dia é deles. Rugas que contam caminhada maravilhosa, mãos antigas que se enlaçam como há 50 anos atrás. Não precisam de palavras, há um livro inteiro escrito a dois, numa cumplicidade que nunca se esmoreceu, pelo contrário, ganhou corpo com o tempo, os problemas, as desilusões, as infinitas alegrias de uma vida inteira juntos. E a musica continua aleatória, e o vento que bate no pinheiro que ainda se ergue velho e cansado.
- Tens fome?
- Não, tu tens?
- Não….
Não falam mas pensam juntos, relembram o primeiro beijo, o passeio à beira mar, o casamento, lindo e feliz, o nascimento do primeiro filho, cheio de sobressaltos mas tão intenso, como manda a lei de um primeiro, depois do segundo e terceiro. Lembram as dores também, mas estão longe e cicatrizadas, de seguida os netos, a correria, as conversas com vinho branco. Falam sem nada dizer, dois velhos juntos uma vida inteira, de mão dada 50 anos depois, dois velhos cujo amor crepita como o fogo na lareira agora aberta.
- Casas comigo?
Ela ri-se, beija-lhe o pescoço apertando-lhe a mão, e de olhos fechados ao som do vento que uiva lá fora, reponde-lhe: caso pois…

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